Renovar
o conhecimento diariamente e a vocação para ensinar são os principais
motivos que levam jovens a escolher dar aula. Do outro lado da balança,
estão a baixa remuneração e a falta de valorização do professor. A
equação da profissão carregada de responsabilidade e de contradições
não é fácil resolver, e tem ainda mais desafios para quem está
chegando às salas de aula, com vontade de inovar e pouca experiência.
“O
professor está sempre aprendendo. Trabalha com diferentes ideais,
classes sociais, é muito enriquecedor. Cada aula é diferente, porque as
turmas são diferentes e os processos de aprendizagem também”, resume
Marcel Pires, 21 anos, estudante de Licenciatura em Letras na PUC-SP e
professor auxiliar do 8º e 9º ano do ensino fundamental na Escola Nossa
Senhora das Graças.
A
aprendizagem das crianças é o que motiva Cintia Andrade e Silva, de 26
anos, a cursar pedagogia e a ser professora da educação infantil. “É
muito gratificante ver o desenvolvimento do aluno, a superação das
dificuldades e os resultados acontecendo”, afirma a estudante do último
ano da Uniban, na capital paulista.
A
colega Joice Pereira Silva, de 25 anos, aluna de Pedagogia da Unip
destaca que o profissional de educação básica está sendo mais
valorizado. “Antes as pessoas achavam que a gente só brincava com os
alunos, mas hoje sabem que ensinamos todos os princípios básicos para o
desenvolvimento de uma criança”, aponta a professora do colégio Augusto
Laranja.
Remuneração
Em
contraste com a necessidade de renovar o conhecimento dando
continuidade aos estudos e aumentando a bagagem cultural, estão a baixa
remuneração e a falta de um plano de carreira atraente. Eduardo Akio
Shoji, 24 anos, estudou a vida escolar inteira na rede pública, mas não
pretende trabalhar lá. “Fiz estágio na mesma escola onde estudei. Como
professor, reparei que faltam condições mínimas para exercer o meu
trabalho, tanto salariais, quanto de infraestrutura básica – faltam
cadeiras, uma lousa decente, portas nas salas e o barulho exterior
impossibilita uma aula de Literatura com a análise de um poema”, conta o
estudante do último ano de Licenciatura em Letras na Universidade de
São Paulo (USP).
Polyana
Maria Costa Martins, de 24 anos, faz duas graduações na área de
educação. Letras, pela Universidade Federal do Maranhão (UFMA) e
pedagogia, pela Universidade Estadual do Maranhão (Uema). Hoje, sonda
escolas mas afirma que pretende montar um negócio próprio em educação e
não viver a vida inteira como professora. “Na área privada, você tem um
salário razoável, mas não tem estabilidade. No setor público, você não
tem um bom salário. Eu quero fazer meu nome e viver como educadora.
Mas não como empregada”, declara.
Foto: Amana Salles/Fotoarena Ampliar
Cintia estagiou em creche pública e pretende trabalhar na rede particular: "Salário e infraestrutura são melhores"
A
escola pública é a opção menos atraente para o estudante de
Licenciatura. As bolsas de estudo para a pós-graduação, outras
atividades profissionais e a escola particular apresentam possibilidades de renda mais elevada.
“Muitos alunos das licenciaturas são gradativamente levados para
iniciação científica, para o mestrado e para o doutorado. Não
conseguimos atrair os profissionais para a educação básica, porque falta
um plano de carreira estimulante e desafiador para esses jovens”,
aponta Mozart Neves Ramos, especialista em educação e professor de
Licenciatura em Química e Física da Universidade Federal de Pernambuco.
Inovar é desafio
Como
ensinar diferente? Como fazer o conteúdo ter “sentido” para os alunos?
Como provocá-los e estimulá-los? Com essas perguntas e munidos de
conceitos inovadores os jovens professores chegam à sala de aula. Se na
faculdade eles aprendem a inovar, a entender o contexto do aluno, usar
a interdisciplinaridade, transformar o estudante em um pesquisador
autônomo, na prática, sentem dificuldade em transpor os conceitos.
“É
desafiador lidar com o modelo da escola. Ele é ultrapassado, temos que
inventar algo diferente e ao mesmo tempo temos que nos adequar ao
padrão da escola, ao que o MEC exige, ao que o livro didático propõe.
Você sai da faculdade com uma visão inovadora, mas às vezes recorre ao
modelo que teve na escola e acaba reproduzindo as aulas que teve”,
aponta Caroline Theml Pinto, 27 anos, professora de Redação formada em
Letras pela Universidade de São Paulo (USP).
Apesar
das restrições impostas ao trabalho do professor – pelo currículo
escolar e pela própria escola –, Eduardo avalia que há espaço para o
docente criar e driblar as barreiras. “A posição do professor me
incomoda e ao mesmo tempo me instiga”, afirma.
Faculdade longe da escola
Estudantes
e recém-formados destacam que os docentes das licenciaturas são
pesquisadores, cientistas, especialistas, mas não tem experiência na
educação básica – ou a tiveram há décadas. Esse distanciamento cria uma
visão utópica e científica do ensino, baseada nos relatórios dos
estágios.
Mozart
acredita que a faculdade está distante da realidade escolar e aposta
na criação de uma “residência docente” para evitar que os profissionais
cheguem às salas de aula despreparados. “O currículo das licenciaturas
é quase que exclusivamente voltado para bacharéis. Nossa cultura é
formar pesquisadores e não profissionais da educação básica”, destaca o
conselheiro do movimento Todos Pela Educação.
Foto: Marina Morena Costa Ampliar
Marcel e Caroline veem a faculdade distante da realidade escolar: desafio é inovar
Como
auxiliares na Escola Nossa Senhora das Graças, Caroline e Marcel viram
projetos serem desenvolvidos na prática. Para melhorar o desempenho de
uma turma do 2º ano do ensino médio que não se envolvia com a produção
de texto, Caroline e o professor titular da escola apresentaram dois
filmes para os alunos “Tempos Modernos”, de Charles Chaplin, e “Nós que
aqui estamos por vós esperamos”, de Marcelo Mazagão. “Eles se sentiam
reprimidos e se identificaram com as obras. Depois disso a produção de
texto melhorou muito”, lembra.
Já
Marcel trabalhou por mais de dois meses em um projeto no qual os
alunos do 9º ano do ensino fundamental tinham que escrever um conto de
amor, inspirados na canção “Eu sei que vou te amar”, de Vinícius de
Moraes. Vendo os primeiros textos, Marcel achou que o projeto não daria
certo, que os alunos não iam se envolver, mas o resultado mostrou um
amadurecimento deles como escritores. “A professora que eu auxilio faz
esse projeto há anos e sabia que iria dar certo. Para mim era a primeira
vez e parecia muito difícil que o resultado final ficasse tão bom. Foi
um aprendizado.”
*Colaborou Wilson Lima, iG Maranhão
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